Postada em 18/12/2024 às 14:29
Por Maria Helena da Bernarda
“Sou o mais velho de cinco filhos. Os três primeiros são rapazes e filhos biológicos. As duas mais novas são meninas e foram legalmente adoptadas logo após o nascimento.
Em casa nunca houve diferença no tratamento… porque não havia abundância para nenhum de nós. Por isso, a chegada de mais um filho já não era festejada pelos outros.
A gravidez de um filho biológico é entendida como uma inevitabilidade. Aconteceu, já está, o bebé tem de ser bem vindo. A procura de mais filhos já é uma escolha, a meu ver um pouco inconsciente. É que, sendo eu o mais velho e bastante pragmático, tinha um certo instinto de proteção sobre os mais novos e observava as dificuldades que enfrentávamos todos os dias.
Os meus pais eram muito boas pessoas, mas em casa reinava o caos financeiro. De tal forma que aquilo já não me parecia bondade, mas inconsciência. O amor crescia na razão inversa do dinheiro. Consequência: passámos muitas dificuldades na infância.
Sublinho que recebemos bem as meninas e não as culpámos, de modo nenhum. Eram nossas irmãs, brincávamos juntos, partilhávamos tudo.
O momento mais crítico, quando tomei consciência do incómodo que sentia, aconteceu quando uma senhora foi lá a casa, de barriga bem grande, pedido que a minha mãe ficasse também com essa criança que estava para nascer. Quando ela se afastou, tive uma conversa com a minha mãe: ‘Mãe, nós já somos sete no caos dessa casa. Mais um bebé é uma inconsciência. Não podemos ajudar essa senhora de outra forma?” E foi o que aconteceu!
Tivemos carência de muitas coisas mas não do essencial: amor e educação. Aprendemos cedo a ter consciência de que cada recurso tem os seus limites e cada escolha tem a sua consequência.
Apesar dos aspetos positivos, a verdade é que eu não estava feliz naquele ambiente caótico. Senti vontade de sair e, ao mesmo tempo, de fugir à incerteza. Desejava uma estabilidade que nunca sentira. Talvez seja por isso que casei cedo e muito determinado, aos 21 anos, com uma mulher mais velha.
Passados 15 anos de um casamento feliz e com o cargo de Diretor de divisão de um grande banco de investimento brasileiro, larguei o emprego para viver em Portugal. Era agora ou nunca!"